Viagem ao sertão

Marcelo Gomes e Karim Aïnouz fazem Road Movie nordestino

                                          Foto Divulgação

Fonte: http://www.cultura.rj.gov.br/materias/viagem-ao-sertao

O filme Viajo porque preciso, volto porque te amo, que estreia esta semana no Rio de Janeiro, é marcado por várias buscas. Se o sertão busca por água, o personagem principal José Renato busca o sertão. E os premiados diretores Marcelo Gomes e Karim Aïnouz, dois expressivos expoentes da nova safra do cinema nordestino, buscam claramente suas origens. Marcelo e Karim se aproveitam do interesse em revelar as histórias que ouviram de seus antepassados para mostrar ao restante do país o agreste nordestino e, ao mesmo tempo, dar vida ao geólogo de 35 anos.

Irandhir Santos interpreta José Renato, que não aparece em cena, mas conduz o público a uma viagem na região semidesértica do Nordeste. José é enviado para uma pesquisa de campo, onde deve avaliar o percurso de um canal que levará água para regiões mais áridas. A construção significa água para alguns e remoção para outros. Famílias serão removidas, áreas serão submersas e é nesse clima que se desenvolve a jornada de José.

O abandono da região faz um paralelo com o do personagem, já que o vazio demonstrado pelo geógrafo logo se descortina, ao revelar que José Renato foi abandonado pela mulher, Joana. Solidão, saudade e desamparo o acompanham em sua jornada, transformando a vida e apresentando ao público uma nova paisagem. Um diário de bordo, onde são percebidas as reações do personagem durante sua travessia, é a consequência deste processo.

O geólogo, para suprir o vazio deixado pela mulher amada, acaba absorvendo com mais intensidade as sensações que emanam dos detalhes ao seu redor. A narrativa em primeira pessoa revela as preocupações, os medos e as descobertas do personagem. A estética de homem abandonado é ressaltada por canções de amor e pela marca do brega nordestino, que dá a noção de “dor de cotovelo” ao longa. O brega também esta associado ao título do filme, que foi retirado de um bar a margem da estrada.

Para os diretores Karim e Marcelo, retratar o sertão é falar do passado de seus avôs, e por isso utilizam o personagem para apresentar uma região que, ao mesmo tempo, causa estranheza e encantamento. Em sua jornada, o geólogo vai recolhendo imagens que são apresentadas em diversos formatos, como polaroids, super 8 e DVcam, mesclando o novo com o antigo e trazendo o filme para perto do espectador, transformando essa experiência em algo mais pessoal. Segundo os diretores, ao colocar um homem comum como personagem principal, fazendo a travessia por uma região inóspita, o filme leva o público a sentir o abandono vivido por José Renato.

“Queríamos fazer um filme à flor da pele. José Renato não é um grande escritor, nem um grande retirante ou um grande vaqueiro, nem um grande herói, e sim um homem comum - um colecionador de impressões” - ressalta o diretor Marcelo Gomes.

Parceria antiga

Os diretores começaram a trabalhar juntos em 1996, época de seus primeiros longas. A afinidade na parceria é creditada ao gosto comum pelo cinema e pela vontade de descortinar novos caminhos. Na busca por locações e durante a produção de seus filmes anteriores, ambos os diretores já haviam pesquisado a região. O material utilizado para a realização de filmes como Cinema, Aspirinas e Urubus e Céu de Suely serviu como base para a realização de Viajo porque preciso, volto porque te amo.

Karim Aïnouz descreve o processo de parceria:

“É um trabalho que se dá através do diálogo, da troca, de uma alegria. O bacana é que somos bem diferentes. Trabalho muito com o confronto; Marcelo trabalha de uma maneira mais doce. E, apesar das diferenças, temos curiosidades em comum. É essa curiosidade quase febril que nos ajuda a olhar para as coisas, para o mundo, para questões que nos inquietam.”

Marcelo Gomes, recifense, teve seu primeiro longa Cinemas, Aspirinas e Urubus reconhecido ao redor do mundo. O filme estreou no Festival de Cannes em 2005 e saiu com o France´s Award do Ministério da Educação, um entre os mais de 50 prêmios que a obra recebeu pelo mundo. Atualmente trabalha em seu novo projeto Era uma vez Verônica. Karim Aïnouz já dirigiu os longas Madame Satã e Céu de Suely, ambos premiados no exterior, e tem como novo trabalho o filme Praia do futuro.

Viajo porque preciso, volto porque te amo já foi exibido em festivais de Veneza, Havana, Portugal, EUA e França. Neste último ganhou o Grand Prix Coup de Coeur do 22º Rencontres Cinémas D’Amerique Latine de Toulouse.

Colaboração de Gustavo Durán

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